“Por que queremos o verão antes que a primavera?”: Uma discussão sobre o planejamento e o bem comum

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 Aburrido é uma dessas palavras que encontramos em outro idioma sem um termo correspondente em nossa língua materna que consiga traduzir todo seu sentido. Aliás, colocar em palavras o que tentamos expressar corresponde sempre a um risco de sermos mal ou incompletamente compreendidos. Por isso os diversos idiomas, e também os códigos de cada cultura, podem representar uma ajuda à difícil tarefa de darmos sentido ou seguirmos buscando sentidos às nossas inquietações mais profundas, sejam elas pessoais ou cientificas.  Pois com pretexto do aburrimiento, timidamente insurgiu e ganhou forma a discussão sobre Planejamento e bem comum nos e-mails do grupo de pesquisa, que, por sua vez, se tornou insumo do presente texto. Talvez em um estudo estatístico que levasse em consideração o universo amostral dos expertos de planning, esta seria uma amostra pouco representativa para fazer inferências e generalizações sobre o tema. Mas, nas ciências sociais, as polarizações que deram corpo a essa discussão já servem como uma pista capaz de indicar a complexidade, os questionamentos no qual se insere a temática e também os rumos que ela pode seguir.
Desde um lugar que deve ser mais do que encantador (pelos relatos de seus admiradores, e claro, por suas belas cadeiras coloridas), que um dos mais polemistas membros do grupo de pesquisa embarcou (e embarcamos juntos, ainda que somente no plano intelectual) em mais uma viagem dessas que não são somente físicas, mas de buscas por significados e entendimentos, por códigos e outras experiências culturais como forma de dar luz às suas inquietações, científicas, vale esclarecer!
Como fruto do forte envolvimento com o tema e participação nos PXOMs (Plan General de Ordenación Municipal), emergiram diferentes posturas e formas de enxergar o problema, revelando um pouco dos limites e das possibilidades no âmbito de planejamento estratégico e Ordenação Territorial na Galícia. Houve quem dissesse que esta tarefa na Galícia era um sonho ou utopia, mas tocado pela esperança e notícias de exemplos reais e positivos em outras partes do mundo. Mundo este que, ao que tudo indica, tem conexões para além de geográficas, mas também neuronais!
Sonhando com dias menos frios, o polemista do grupo iniciou o paralelo do planejamento com as estações do ano. E dando asas ao paralelo, os posicionamentos da discussão do email revelaram, de uma forma metafórica, que entre nós há gente que sonha com o verão ainda que distante ou ilusório, outros que se alegram com os sinais da primavera e a outros o descongelar de um rio já representa um passinho, mesmo considerando a doença do planejador, geralmente incompreendido neste mundo da vida. Dentre os que esperam o descongelar do rio vem a ressalva de que muitas idéias são impraticáveis porque muitos querem levar adiante os planos em apenas uma fase, como verões antes das primaveras.
Entre os diversos posicionamentos, foi possível perceber que cada um espera a primavera a seu modo. Um posicionamento foi de que os planos não são levados a cabo como deveriam na Galícia porque as pessoas, em meio a tantas transformações – sobretudo de sociedade rural a urbana, ainda não são capazes de enxergar de forma clara a utilidade do planejamento, alegando e ao mesmo contrariando aos do gelo, que este se faz pelo bem comum, remetendo a coesão social dos maias que foram capazes de desenvolver uma civilização no alto das montanhas e não nos vales férteis como a maioria das demais sociedades. Sob esta ótica, o planejamento seria uma construção social na qual os indivíduos são impelidos a buscar o bem comum, movidos pela solidariedade, que na opinião deste estudioso, é inerente à sociedade. Houve gente que, sem muito entender do tema arriscou uma opinião contrária ao suposto de que a solidariedade move as ações humanas, apontando que a coesão social pode ser lograda articulando-se interesses individuais, de modo que um não elimina o outro, sendo o desenvolvimento um processo que se vê ameaçado por transformações exógenas, de cima para baixo. De tal modo, a conquista do bem comum teria suas limitações pela incapacidade de que as práticas sejam antecedidas de idéias e transformações institucionais. E nesta linha, se complementou a opinião de um experto no sentido de que é necessário pensar que o planejador é uma ferramenta e que existem outros fatores na sociedade que interferem na execução dos planos, sendo para ele, a questão fundamental que a sociedade consiga enxergar um beneficio, algo positivo, para chegar ao tão esperado bem comum.
Finalmente, surgiu um olhar que rechaçou o bem comum e bem individual pela perspectiva dicotômica, sublinhando que não buscar o bem comum seria sintoma de uma sociedade doente. Propôs que o bem individual (satisfação, felicidade, etc) pode se basear ou delimitar-se pelo bem de todos, sendo o desafio hodierno entender o que é ou não bem comum.
Em Lugo seguimos assim...a espera da primavera que já dá seus primeiros sinais e que muito alegra a brasileira que vos escreve.

Nathália Thaís Cosmo da Silva


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